terça-feira, 17 de abril de 2012

A angústia e o inconsciente determinados pela escolha




“Que mentir para si mesmo é sempre a pior mentira” - Legião Urbana

Freud não estava errado quando dizia que somos frutos da nossa história familiar, do nosso passado, do contexto em que fomos criados. No entanto, podemos mudar o rumo da nossa história a qualquer momento. Porém, se optamos por aceitar o determinismo psíquico ou a própria teoria do inconsciente de Freud para justificar o que somos e fazemos hoje, usamos de má-fé.  
Má-fé é um conceito que foi criado por Jean Paul Sartre, filósofo existencialista do século 19. O existencialismo considera cada ser humano como único, e senhor absoluto do seu destino e de suas atitudes. Salienta a subjetividade, a responsabilidade e a liberdade individual do homem, que este só pode esquecer por má-fé.
No seu artigo Filosofia da Liberdade, Sérgio Amaral Silva diz que para Sartre a má-fé é um mecanismo pelo qual o homem procura se defender da angústia que a consciência da liberdade provoca. Todavia, por meio dessa defesa equivocada, nos distanciamos de nosso projeto pessoal, nosso projeto de vida – do que somos e queremos ser – incorrendo no equívoco de explicar nossos fracassos pela interferência de fatores externos como Deus, o destino, os astros ou a sorte. Nesse contexto, inclusive a teoria do inconsciente, formulada por Sigmund Freud (1856- 1939), era considerada um exemplo de má-fé. Visto que, de acordo com Freud, as pessoas experimentam repetidamente pensamentos e sentimentos que são tão dolorosos que não podem suportá-los. Tais pensamentos e sentimentos (assim como as recordações associadas a eles) não podem ser expulsos da mente, mas, em troca, são expulsos do consciente para formar parte do inconsciente, são reprimidos.
Freud comparou a mente humana com um iceberg, um grande bloco de gelo flutuante onde a ponta que fica visível seria a consciência, enquanto que a imensa porção submersa representaria o inconsciente, contendo os traumas, frustrações, vontades reprimidas e inconfessos desejos. Esse conteúdo reprimido não consegue acessar diretamente o consciente, mas acaba emergindo pelas manifestações do inconsciente que são: os sintomas, sonhos, chistes ou atos falhos, presentes no que ele chamou de psicopatologia da vida cotidiana. Desse modo, na visão freudiana, o inconsciente é um enorme subterrâneo de forças vitais invisíveis, motivando a maior parte dos pensamentos e ações conscientes do homem, além de ser o responsável por grande parte dos distúrbios psíquicos. Porém, é o que nos mantêm na “dita normalidade” que a sociedade, ou seja, nós homens determinamos.
A questão não é confrontar o existencialismo com a teoria Freudiana, mas entender o homem e suas escolhas por meio dessas duas correntes representativas. Mesmo o existencialismo tendo surgido depois de Freud, numa outra época, num outro contexto, o fato do homem ter que assumir ser o único responsável pelo seu destino, invariavelmente, faz com que ele passe a viver num estado de angústia, de desamparo e desespero. No seu livro o Existencialismo é um Humanismo, Jean Paul Sartre, diz que o homem que se engaja e que se dá conta de que ele não é apenas quem ele escolheu ser, mas também um legislador que escolhe simultaneamente a si mesmo e a humanidade inteira, não consegue escapar ao sentimento de sua total e profunda responsabilidade. Segundo Sérgio Amaral Silva, enquanto está sozinha, a consciência do homem pode reinar como senhora absoluta de seu destino e usufruir em plenitude de uma liberdade que desconhece barreiras. Isso se transforma radicalmente na presença do outro, cuja subjetividade passa a ser mais uma entre as coisas do mundo. Ao contrário da situação anterior, essa nova coisa não é apenas mais uma que se oferece passivamente à minha apreciação, mas ela, ao mesmo tempo, me identifica, não mais como o sujeito que eu era, mas como objeto de seu mundo. Sou, de certo modo, paralisado pelo meu próprio olhar. Passo a ser observado e julgado com a liberdade do pensamento alheio, sobre o qual não tenho nenhum poder ou influência. Ou seja, o outro pode pensar o que quiser sobre mim, independente da minha vontade ou controle, o que representa uma ameaça permanente. A liberdade alheia é um perigo para a minha, que também a põe em risco.  No entanto, esse é o preço a pagar pela escolha de ser o senhor de sua liberdade.
A grande questão é que se reprimimos, recalcamos, se utilizamos de mecanismos de defesas ou nossas ações e vontades vem à tona por meio das manifestações do inconsciente – atos falhos, chistes, sonhos ou sintomas -, existe uma razão para que elas se manifestem dessa forma. Existe uma razão por agirmos de má-fé. E somos nós que escolhemos. Descobrir os “por quês” cabe a cada um, se for do seu interesse entender. Uma das formas de se aprofundar nas suas próprias questões é pela busca do autoconhecimento, que pode ser feito por meio da terapia, seja ela individual ou em grupo. 

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