Ainda na sociedade de hoje
uma questão que nos acompanha desde 530 a .C com Parmênides é a que gera a corrosiva
angústia do ser ou não ser e suscita o questionamento fundamental: afinal quem
somos nós?
No fim do século XIX o
existencialismo tenta responder essa questão, quando grande parte do pensamento
intelectual estava ruindo. Muita gente pensou que os seres humanos estivessem
prestes a adquirir todo conhecimento, predominando a idéia de que restavam
apenas alguns problemas de física e matemática e que, uma vez resolvidos, nosso
conhecimento do mundo teórico e natural estaria completo.
Evidentemente, logo que
pareceu que estávamos nos aproximando das respostas surgiram novas questões
irrespondíveis: (i) A teoria da relatividade de Einstein nos mostrou que a
extensão, massa e tempo não eram absolutos, mas sim que as coisas são medidas
em relação às outras coisas – somente a velocidade da luz parece invariável;
(ii) A teoria quântica (e o princípio da incerteza de Heisenberg) demonstrou
que, apesar do equipamento sofisticado, o material da natureza submicroscópica
contém pares de coisas que não podemos medir com precisão em um determinado
momento; (iii) O teorema da não-completude de Gödels demonstrou que há teoremas
que nunca seremos capazes de confirmar ou refutar – por conseguinte, algumas
questões em matemática nunca serão respondidas.
Com essa perda súbita do
absoluto – isto é, ao sermos condenados ao conhecimento imperfeito em lógica,
matemática e física -, nos deparamos com lacunas de conhecimento ainda maiores
nas esferas biológica, psicológica e social, não podíamos mais recorrer à soma
total de conhecimento para nos tornarmos mais sábios, logo, o progresso
científico e tecnológico teve de ser moderado pelos novos insights filosóficos.
Os existencialistas
intervieram direto nessa lacuna. Rejeitaram o essencialismo platônico (e a
idéia do conhecimento perfeito) que havia dominado a filosofia até então.
Acreditavam que não existia nenhuma essência inicial, somente o ser.
Pensar em um universo
imprevisível e indiferente leva muitos ao desespero. É uma visão de mundo alienada,
isolada e sem atrativos à primeira vista, onde o sentimento por trás disso tudo
é: “Por que então se levantar de manhã.” Soren Kierkegaard – geralmente
considerado o primeiro existencialista, apesar de sua inclinação cristã, em
nítido contraste com o ateísmo da maioria dos existencialistas – chamou de
“pavor” a reação que se tem ao encarar essa visão de nossa vida.
Esta visão Sartre chamou
de “náusea”: Tudo é gratuito, este jardim, esta cidade, eu mesmo. Quando você
de repente percebe isso, sente-se enjoado e tudo como a ser carregado pelo
ar... é a náusea.
Na verdade, alguns
consideram o existencialismo mais uma disposição do que uma filosofia, e alguns
de seus textos principais são de fato romances (sobretudo os escritos por
Sartre e Camus) e não tratados filosóficos.
Mas o ponto fundamental
muitas vezes é negligenciado: os existencialistas estavam empenhados em uma
busca moral para fazer a coisa certa na ausência de uma idéia essencial de
bondade e privados da autoridade divina. Argumentavam que devíamos fazer a
coisa certa mesmo quando não há razão para isso, e que coragem e integridade
verdadeira significavam fazer a coisa certa para o seu próprio bem. É uma
lufada de ar fresco: fazer a coisa certa não por temer o castigo, ou desejar
honrarias, ou achar vantajoso, ou pelo desejo de evitar pecar – mas
simplesmente porque é a coisa certa a fazer. As más ações, então, acontecem
simplesmente porque acontecem, não necessariamente como uma espécie de punição,
libertando-nos da culpa. Precisamos continuar reconhecendo o certo e o errado;
de fato, temos mais razões do que nunca para descobrir a maneira ética. Esse é
o núcleo de esperança e bondade no cerne do existencialismo, quase sempre tão
encoberto na retórica depressiva que é fácil lhe fazer vista grossa. Os
existencialistas redescobriram, de fato, a moralidade.
Kierkegaard percebeu a
dificuldade em encarar a existência pura – sem essência, sem mistério, sem nada
intangível, sem significado, sem propósito, sem valor. Um abismo assoma onde
esperança, progresso e ideais parecem ilusões. As convicções religiosas podem
ser muito confortantes, sejam verdadeiras ou não, e quando o existencialismo,
ou qualquer outra coisa, as elimina.Isso pode provocar ansiedade.
Jean Paul Sartre explorou
outra extensão lógica do existencialismo: se o universo não é determinado,
somos completamente livres para escolher nosso próprio rumo. Embora a
possibilidade permanente – com a responsabilidade da ação caindo sempre sobre o
indivíduo – possa parecer uma proposta desanimadora, também é liberadora.
Independentemente de nossa experiência passada, nós controlamos o rumo do nosso
futuro. Sartre denominou “má-fé” qualquer tentativa de negar que somos
responsáveis por nossas ações, e viu a religião, ou a fé religiosa, como um dos
principais culpados. Fundamenta-se então a tese emblemática do existencialismo,
“a existência precede a essência”, quer dizer exatamente que a realidade humana
não é determinada por qualquer fato extrínseco a ela mesma, que somos livres e
os únicos responsáveis por nossas escolhas. Mas, para Sartre, não basta apenas
dizer que o sujeito é livre; devemos dizer que a subjetividade é liberdade, com
isso fica mais claro o que se deve entender por processo de existir: com
efeito, não sendo o sujeito uma coisa ou uma forma, ele está continuamente em
vias de se constituir, e o faz com liberdade, isto é, sem nada que determine
esse processo pelo qual se constitui a si mesmo. O sujeito nunca é (uma coisa ou algo já constituído essencialmente), mas a
cada momento vem-a-ser aquilo que ele se torna, na dinâmica de uma trajetória
que nunca há de atingir seu ponto final. É esse caráter processual da
subjetividade que nos ajuda a entender outras noções que decorrem da liberdade
radical: a escolha, que está sempre presente em todos os momentos desse
fazer-se contínuo do sujeito, já que se trata de um processo livre, e o
projeto, a maneira pela qual cada sujeito, não estando nunca consolidado em seu
ser, se projeta adiante de si por via de suas escolhas, na intenção de constituir-se
como tal.
Sabendo que a liberdade é
originária e radical, essas escolhas e essa sucessão de projetos, não poderiam
ocorrer por via de critérios previamente estabelecidos, ao qual o sujeito
recorreria para optar e projetar-se. A indeterminação da subjetividade faz com
que o sujeito, a cada escolha, a cada projeto, invente também o critério da
opção que pretende seguir. O sujeito por ser livre, está só e desamparado, por
isso há uma relação tão íntima entre liberdade e angústia. Ao chamar a angústia
existencial de náusea, Sartre também ligou, em certo nível, a mente ao corpo,
reconhecendo que os efeitos desorientadores do existencialismo podem ser
fisicamente desconfortáveis e que podem gerar uma atitude de má-fé, colocando
no externo a responsabilidade por quem somos.
Segundo Jean Paul Sartre
(1), somos responsáveis por nossas escolhas e estas determinam nossa
existência. Assim sendo, assumimos ser quem queremos ser ou escolhemos seguir
os caminhos pré-estabelecidos que nos foram impostos pela sociedade e pela
cultura? e/ou fazemos escolhas fundamentadas no nosso querer ou baseadas no que
recebemos do meio em que vivemos, respectivamente?
Sartre afirma que “o homem
é angústia”(2) em razão da responsabilidade por suas escolhas. Tais escolhas
afetam não só o indivíduo, mas também a humanidade inteira. Ainda que possa ser
disfarçada por outros modos de ver, acreditando-se que “ao agirem só se
implicam nisso a si próprias”(3) , a angústia se manifesta, não sendo possível
fugir-se dela a não ser por uma atitude de má-fé, ou seja, escapando da
angústia provocada pela liberdade de escolha, fugindo à responsabilidade de
assumir a sua própria escolha, deixa que o Outro decida por ele. E a má-fé tem
suas conseqüências.
Nossa maior angústia é a
de saber que somos nós que escolhemos o nosso destino, que tudo está em nossas
mãos. A angústia é gerada por não sabermos aonde nossas escolhas estão nos
levando. Se nós estamos correspondendo ao que se espera de nós. Se nós estamos
caminhando contra ou a favor do que queremos ser. Será que estamos? Afinal, quem somos nós hoje?
(3)Ibidem,p.13
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